Baías e Baronis – FC Porto 3 vs 0 Paços de Ferreira

 

Imaginem-se atrás de uma mesa de carpintaria. Têm à vossa frente uma tábua que está suplicando para que seja penetrada por um prego. Agarram um dos respectivos e colocam-no em cima do respectivo naco de madeira e por algum milagre o cilindro de ferro com a ponta achatada equilibra-se perfeitamente a topo do ex-tronco. Nesse momento, procedem a despejar água a partir de um regador em cima do prego durante quarenta e cinco minutos, esperando que por qualquer magia que descendesse dos céus, o prego se enfiasse dentro da tábua. Passado esse tempo e mais quinze para pensar numa melhor forma de romper os veios da lenha, eis quando surge a ideia: “E se eu usasse um martelo?”. Pum. Pum. Prego lá dentro. Simples, prático, quase bonito. E para que raio precisamos, tanto nós como eles, de sofrer tanto?! Vamos a notas:

 

(+) Moutinho Fez apenas metade do jogo mas esteve na metade que interessou. Conseguiu fazer em meia-dúzia de minutos o que Defour tentou durante toda a primeira parte: rodar a bola para os flancos com critério e bom posicionamento. Nota-se bem que é um jogador diferente dos outros pela postura, a frieza e a capacidade de movimentar a bola e os colegas para o melhor local, pela melhor trajectória e com o melhor intuito. E não está sequer perto do melhor que já o vi a fazer, porque se estivesse ao nível do ano passado, aposto que a equipa não estava tão órfã de ideias e estrutura no meio-campo. Marcou um golo de garra, de força, de empenho e por isso está ali em cima no topo do post. No ar, mais perto dos deuses, onde merece.

(+) James Completa noção de espaço, de área, de movimentação com bola e de localização no terreno de jogo. Vitor Pereira está a apostar nele pelo centro, a focar as jogadas para que a bola passe sempre pelos seus pés quando os lances de ataque se estão a desenrolar seja por que ala fôr, já que James é um perigo permanente para a baliza quando recebe o esférico porque ninguém sabe o que vai fazer a seguir. Não é Messi e nunca será, mas tem o mérito próprio de ser um jogador muito acima da média. Nota-se que os colegas já sabem que quando a bola está nos pés dele, a movimentação é sempre a de tentar furar a defesa, procurar a diagonal para enganar os laterais e confundir os centrais, o que ajuda a empurrar o adversário para trás e deixar James brilhar. Quando aprender a rematar em condições…vai ser ainda mais perigoso.

(+) Álvaro Pereira (na segunda parte) Na primeira parte foi dos poucos que tentou rasgar pelo flanco, já que Hulk e Varela, apagados, não conseguiam romper para o centro. Na segunda parte apareceu nalguma da glória que já nos mostra desde 2009, com arrancadas fulgurantes e cheias de intenção ofensiva, particularmente depois de perceber o desgaste de Manuel José que lhe abriu a ala quase na totalidade. Os cruzamentos continuam a não sair perfeitos mas o nosso Palito parece estar com vontade de voltar aos muito bons velhos tempos do passado recente. De um vencedor da Copa America não se espera menos.

(+) Hulk (depois do jogo) É nestes pormenores que se percebe que um jogador de futebol é, acima de tudo, um homem. Por muito endeusados que sejam, aplaudidos até as mãos ficarem vermelhas e aclamados com gargantas arranhadas, continuam a ser feitos de carne, osso e nalguns casos, gordura em excesso. Hulk esteve mal durante o jogo, sabia disso e não conseguiu dar a volta por cima. Tudo saía mal e nada do que tentava fazer resultava em qualquer coisa de positivo para si ou para a equipa. Saiu, substituído por Vitor Pereira, o homem que todos adoram odiar, que teve a lata de o tirar do jogo e muito bem. Abafado pelo irónico aplauso de meio estádio, aparentemente repleto de anormais que de Portistas só devem ter um cartão de sócio e pouco mais, Hulk saiu chateado, com ele e com o mundo, retirando-se para o balneário sozinho e sem passar pelo banco nem pela casa de partida nem receber dois mil escudos. Fez mal (ler abaixo). Depois do jogo, a falar para as rádios (eu ia a caminho de casa e foi aí que ouvi as palavras dele), penitenciou-se, sem pedir desculpa aos adeptos (concordo) mas fazendo-os aos colegas e à chefia, aos que têm de conviver com ele diariamente e poderiam ficar incomodados com o que tinha passado. Atitude digna, humilde e humana de um super-herói que por trinta minutos desceu ao nível dos mortais.

 

(-) Passividade Ao nível do jogo contra o APOEL, com a agravante do adversário ser mais fraco (mas atenuado pelo resultado ser positivo), a primeira parte foi uma das exibições mais abjectas do FC Porto que me lembro de ver. Quase todos os jogadores a praticarem um futebol absurdamente mau, sem ritmo, sem vida, com falhas técnicas anormais, inconsequências permanentes nas bolas ofensivas, falhas inadmissíveis na defesa e uma imagem de desânimo e falta de confiança que fariam o Velho do Restelo parecer um optimista. Mau demais para aqui narrar, entre as bolas que saltavam em frente a jogadores hesitantes, alívios para o ar em ângulos de 80 graus e ressaltos a mais para pernas a menos, é este tipo de jogos que afastam os adeptos do estádio. Sapunaru esteve horrível e com desatenções infantis, Varela lento e trapalhão, Fernando atabalhoado e trémulo, Belluschi sem acertar um passe, Defour a fazer pior que Belluschi e Hulk…ver abaixo. A primeira jogada de jeito aconteceu aos 51 minutos. E a partir daí as coisas mudaram. Felizmente.

(-) Sapunaru O jogo mais fraco da época para o romeno. Em bom português, Cristian, não deste uma prá caixa. Não subiu pelo flanco como devia, pareceu excessivamente nervoso durante grande parte do jogo mas acima de tudo o que me impressionou foi a incapacidade de se entender com Rolando, eles que jogam juntos desde…ora deixa-me cá ver…2008. Falhas infantis na defesa, terrível posicionamento perante o adversário e uma sensação durante todo o jogo que se a bola fosse para o lado dele, qualquer coisa havia de acontecer de muito mau para a nossa equipa. Atina, homem!

(-) Hulk (durante o jogo) Foi um jogo fraquíssimo de Hulk, onde nada correu bem. As fintas saíam muito próximas dos defesas quando o seu ponto forte continua a ser o drible em progressão rápida, com a bola bem adiantada para que usando a força e a velocidade consiga chegar primeiro que o defensor. Nunca o fez e perdeu-se em meandros recuados, com bola atrás de bola a ficar para qualquer tipo de amarelo que lhe aparecia à frente. O público fartou-se e pegou no assobio que parece sempre trazer na matraca e começou a apitar. É evidente que a insatisfação era notória, mas Hulk levou a peito e ainda conseguiu fazer pior, saindo chateado e sem dar cavaco aos colegas nem ao treinador. Não lhe ficou nada bem e ainda no estádio temi que pudesse ter havido outro tipo de consequências decorrentes desta atitude. Quando estes jogos começam a correr desta forma, Hulk tem de mudar para o estilo mais prático, mais passador e com menos bola. Caso contrário vai apanhar muitas mais destas assobiadelas monumentais, porque a gente que lá está parece exigir mais dos outros do que exige a si própria.

 

A maneira surreal com que chegamos ao intervalo, numa mistura estranhíssima de assobios e aplausos, não fazia prever que a segunda parte tivesse um nível de produção tão acima da primeira. E o que mais surpreende é que nem foi assim nada por aí fora para o que já vimos a maior parte destes rapazes a fazer no ano passado, mas os níveis de confiança dos adeptos nesta equipa que temos visto são tão baixos e a expectativa é tão reduzida que um jogo banalíssimo contra o Paços de Ferreira, combativo mas inconsequente, acaba por deixar a malta satisfeita. Ou talvez não. O ambiente no final da partida era soturno, triste e cheio de lamentação. Não estamos a jogar futebol a sério, a equipa nota-se que mostra uma intranquilidade enorme com a bola e ainda maior sem ela, e o facto de continuarmos a vencer jogos deste calibre com resultados deste género mostra muito sobre a competitividade do nosso campeonato. Melhores tempos virão, estou certo, tempos de maior estabilidade e futebol mais condizente com o nosso nível. Looking forward to it.

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