Maturidade

Todos os anos acontece algo semelhante. Um ou outro jogador sobem pelos escalões de formação ou são contratados ainda muito novos, começam a evoluir na equipa principal depois de uma ou outra época que passam emprestados a clubes onde podem crescer e ganhar tempo de jogo. Quase desde o início que me lembro de ver a malta a criar expectativas no início da temporada, alimentados pela imprensa ou pelo zum-zum que vai atravessando montanhas sobre “aquele puto que parece que joga de carago e agora é que vamos ver porque parece que temos aí um novo Maradona/Figo/Messi” (dependendo do ano). E durante muitos anos houve poucos que conseguiram mostrar talento e maturidade de uma forma suficientemente consistente para se tornarem numa figura que pode ser mais que um nome na lista de convocados de vez em quando.

Houve muitos nomes que apareceram ao longo dos anos e que foram lançados pelos consecutivos treinadores, com pouco ou nenhum aproveitamento em condições. Apontando as lanternas para os anos que me trazem memórias mais consistentes, lembro-me de Robson com os diamantes africanos N’tsunda e Zwane; Oliveira com Costa, Fernando Santos com Cândido Costa ou Ricardo Sousa, Octávio com Kaviedes, Mourinho a lançar Paulo Costa, Ricardo Fernandes e Bruno Moraes, Fernandez com Leandro do Bonfim e Ivanildo, Adriaanse com Helder Barbosa, Jesualdo com Vieirinha, Diogo Valente, Candeias, Rui Pedro, Pélé ou Rabiola e Villas-Boas com Walter, Souza e Ukra. Nenhum deles conseguiu atingir níveis condizentes com um jogador que fica nas bocas do mundo portista e que foram desaparecendo nas nossas mentes, reaparecendo pontualmente por entre tantos outros nomes de rapazes que já vestiram a nossa camisola mas que nunca chegaram a patamares de “recordáveis”.

Mas também houve vários exemplos de apostas na juventude que deram bons resultados razoáveis ou até excelentes. Fernando Santos com Deco, Mourinho a usar Paulo Ferreira, César Peixoto, Ricardo Carvalho, Helder Postiga, Carlos Alberto ou a dupla de Ricardos (Costa e Carvalho) ou Jesualdo com Anderson, Fucile, Rolando, Cissokho e Hulk. Até que chegámos a Villas-Boas que começou a rampa de crescimento para Maicon ou James e, passando o testemunho para Vitor Pereira, deixou que o espinhense pudesse pegar nos jovens talentos e decidisse quando os deveria colocar a jogar. E os resultados têm sido muito positivos. Já no ano passado Maicon atravessou uma viagem cheia de vidro moído no prato da jardineira quando jogava a defesa-direito. E cresceu à custa disso. James aprendeu a jogar na ala, no centro, na frente e atrás. E cresceu à custa disso. E este ano começamos a ter Castro e Kelvin, Alex Sandro e Danilo, Atsu e Abdoulaye, Mangala e Iturbe, que começam a calçar as botas como titulares pontuais, sem que a equipa se ressinta de algumas modificações que a equipa necessita mas que acima de tudo é o treinador que faz com que esses mesmos rapazes aprendam à custa dos erros e saibam que têm atrás deles uma estrutura que os apoia mas acima de tudo um líder que acredita neles e que lhes dá a injecção de moral necessária para serem produtivos e para ficarem os homens que queremos.

Estou a gostar de ver os putos a crescer. Continua, Vitor, sem medos.

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Vai ser golo, não foi?

As coisas têm corrido bem e as vitórias vão-se acumulando. E o esquema que Vitor Pereira implementou no FC Porto, uma espécie de hibridização entre o 4-3-3 estável (mas Hulk-dependente) e um 4-4-2 bastante móvel com variações entre Lucho/Moutinho/James a marcar o ritmo das partidas está a funcionar bem. Melhor nuns jogos que noutros, mas ainda assim estou agradado com o que tenho visto. Mas daqui a alguns jogos, quando começarmos a encontrar equipas que nos podem fazer fechar lá atrás como uma freira de clausura com prisão de ventre, seja pela valia do adversário ou por circunstâncias do próprio jogo (uma expulsão, lesões de jogadores fundamentais ou vantagens tangenciais que é necessário proteger a todo o custo), aí é que vamos ter de adaptar o nosso estilo para sermos um único corpo resultadista em vez de tentarmos construir uma estrutura que permita à equipa vaguear pelo campo e criar lances ofensivos com cabeça.

E ao contrário do 4-5-1 de Mourinho, onde tínhamos talvez o melhor meio-campo que vi a jogar com as nossas cores (para os mais esquecidos, era composto por Costinha/Maniche/Deco, com a pontual adição de Alenitchev ou Pedro Mendes) e a rigidez táctica colocava uma carapaça quase intransponível a partir da qual saíam bolas perfeitas para a ala onde Derlei estava ou para o centro onde McCarthy tinha habitação permanente, desta vez vamos precisar de uma ou outra arma que nos têm faltado esta temporada: a velocidade. Seja Varela, Atsu ou Iturbe, talvez os jogadores mais velozes que temos ao nosso dispôr, um ou mais desses rapazes vão ter de aparecer em grande para ajudar a suprir a falta que um rapaz como Hulk faz numa equipa que em determinadas ocasiões podia servir como alvo principal para contra-ataques rápidos, letais, eficazes. Vários jogos vencemos à custa de raides rápidos de Givanildo, que surgia como uma flecha Telliana por entre defesas subidos e meios-campos inclinados para a área, só para aparecer em posição de remate da forma mais prática e rápida possível. Lembrem-se de Donetsk, Istambul, Madrid. Recordem-se também das corridas de Guarín ou dos voos de Álvaro pelo flanco, ou regressem um pouco ao passado para os sprints de Jorge Couto ou Lisandro. Todos eles eram jogadores que podiam transformar um jogo parecia condenado a uma postura defensiva (porque esses jogos vão existir, por muito que nos possa parecer impensável ver o FC Porto a defender uma magra vantagem ou um empate com golos no terreno do adversário) num constante jogo de gato gordo e rato lesto.

Tenho esperança que Atsu vai continuar a evoluir e vai ser uma peça importante nessas complicadas noites de retranca. Iturbe também, mas com menos esperança de produtividade a curto prazo. Mas é preciso continuar a trabalhar essas setas para que possam ser úteis num futuro próximo. Nunca se sabe quando é que vão ser necessários durante mais que vinte minutos e não só para fazer descansar os titulares.

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Africanizando

Desde que me lembro que o FC Porto não é um clube com presenças marcantes de jogadores deste continente já aqui a sul. É verdade que tivemos a nossa curta dose de africanos simpáticos, com Madjer firme na liderança, McCarthy em posição de destaque e Tarik Sektioui alguns furos abaixo, até chegarmos a zonas ainda mais no fundo da memória, com Chippo, Quinzinho, N’tsunda ou Kiki a ainda trazerem memórias a muitos portistas, umas mais agradáveis que outras. No entanto, o futuro parece querer dizer que algo está a mudar e temos alguns exemplos de jogadores que vão aparecendo nas camadas jovens e são aproveitados para crescerem para serem opções válidas na equipa principal.

O caso de Abdoulaye, que se junta a Atsu como membro de pleno direito do plantel 2012/13 do FC Porto, é um bom exemplo que podemos e devemos seguir. Já na equipa B temos mais alguns elementos como Mikel, M’Bola e agora Seri (marfinense recentemente contratado para o meio-campo da equipa secundária), que tentam mostrar mais alguma coisa que os demais numa reabertura do FC Porto a um mercado que apesar de incerto e de difícil plano para os olheiros navegarem com facilidade, pode trazer frutos muito agradáveis num futuro próximo e que também traz diferenças no estilo e que pode servir para potenciar ainda mais o aparecimento de nomes pouco conhecidos mas com talento para explodirem em clubes que lhes dêem condições para tal.

É verdade que é uma aposta a longo prazo, mas tal como sucedeu em França nos anos 90, esse mesmo investimento no futuro pode ser direccionado para várias áreas do planeta e África é sem dúvida uma delas. E se a ingenuidade táctica e algum excesso de agressividade podem ser um agente limitador da entrada a curto prazo para uma equipa com o grau de exigência do FC Porto, a prospecção antecipada pode fazer com que arestas mais rudes sejam bem limadas e se consigam transformar alguns putos em grandes talentos. Sim, para cada Drogba há um Yero e para cada Essien aparece sempre um Binya. Mas continuará a haver Drogbas e Essiens. É só saber onde procurar e não ter medo de investir.

Abdoulaye e Atsu: a palavra é vossa. Mostrem que estão prontos para serem bem aproveitados. A malta, vão ver, vai gostar do que vê.

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O pós-Hulk – parte III

Nomes, nomes, nomes. Saindo Hulk sai também o mais reconhecível dos nossos jogadores dentro e fora de portas, aquele que enfeita capas de jornais e revistas, cabeçalhos de blogues e brindes promocionais do clube. Por favor, o homem tem talento para ser um desiquilibrador em qualquer ataque, é internacional brasileiro, tem um cabedal que nunca mais acaba e usa uma alcunha de super-herói da Marvel. É um sonho húmido de um marketeer desportivo. E a saída de uma imagem de marca tão vincada para um clube, mais que um Deco ou um Jardel, faz com que o próprio clube necessite de elevar o nível de outro ou outros dos jogadores que se mantém vinculados ao plantel para poder, como sempre fez, continuar a fazer com que o seu nome continue a soar no mundo do futebol como até agora tem vindo a acontecer. E se o visual ajuda, mais até do que seria normal numa sociedade civilizada em que (não) vivemos, onde jornais desportivos colocam artigos atrás de artigos sobre “a jovem brasa do hóquei em campo vietnamita” ou qualquer parvoíce do género, é acima de tudo com o talento e com o bom futebol que estas novas vedetas se vão criando e espalhando a fama e o nome pelo planeta.

Se olharmos para o nosso plantel, há dois nomes que saltam imediatamente à vista em termos de exposição mediática e notoriedade pública: Moutinho e James. Mais alguns já são nomes bem conhecidos de adeptos de futebol, como Lucho, Danilo, Alex Sandro, Otamendi, Defour, Fernando ou até o “caloiro” Jackson, e ainda há mais alguns que estão na linha bem produtiva do jogador com selo de qualidade FC Porto, como Maicon, Mangala, Atsu ou, até ver, Iturbe. Os dois do primeiro grupo têm palettes de talento e um nome já bem vincado no panorama internacional. São jogadores de que dependemos (ou no caso de James, que desesperadamente queremos depender) para vingar já esta temporada e continuar no caminho das vitórias. No segundo grupo há jogadores já com reconhecimento internacional, que representam o país no escalão máximo de notoriedade e criteriosa selecção. É desse grupo que terão de sair a grande maioria das mais-valias que vamos buscar no resto da época para suportar o jogo ofensivo e defensivo da equipa, os nossos dependables. E os jovens do último grupo, os que podem e devem continuar a jogar e a mostrar ao mundo o que valem, qualquer um deles tem talento e margem de progressão ainda suficiente para fazerem uma bela carreira no FC Porto e aparecer em colecções de cromos por todo o mundo.

É nestes rapazes que temos de apostar o nosso futuro. É através de uma política de contratações sã, equilibrada e afinada (como refere e muito bem o Vila Pouca no seu artigo da passada quinta-feira), que dependemos para nos mantermos no topo, sempre no topo. Porque é aí que temos de permanecer para continuar como somos, para nos podermos afirmar sempre com o título que tanto nos orgulha: campeões.

Rapazes: o futuro é vosso. Agarrem-no.

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Uma grande diferença

Quando no passado Sábado vi Varela a acabar de aquecer e a aproximar-se do quarto árbitro para entrar, pensei que estava tudo bem. O Hulk estava talvez no jogo da despedida, se calhar o Vitor queria dar a oportunidade do povo de saudar o rapaz com uma salva de palmas das grandes para que soubesse que vai sair mas fica sempre nos nossos corações – se sair, porque se ficar é só uma questão de voltar a jogar como no ano passado para que ninguém lhe aponte o dedo e lhe chame mercenário como fazem a outros – e até ficava bem. Mas não foi o 12 a sair, mas o 27. E em boa hora também, porque Atsu já estava a começar a mostrar algum cansaço e não era preciso estar a queimar as pernas do rapaz que têm de estar sempre em boas condições porque vamos precisar dele a breve prazo. E quando Varela entra…há uma espécie de sono intenso que se abate pelo flanco esquerdo do ataque, que nem Alex Sandro conseguia mandar abaixo com as correrias, ele que também já estava em modo de descanso.

Gosto do Silvestre mas o rapaz está a perder as qualidades que fizeram dele um dos alvos dos meus aplausos. O mesmo Varela que se lançava por cima dos laterais em 2009, que chegou com uma fome tremenda em 2010 e ajudou (e de que maneira) a cascar no Benfica na Supertaça, tem vindo em trajectória descendente desde há uns anos. Ainda se nota algum fogo nos olhos, alguma vontade, mas a velocidade não é a mesma, o sentido prático parece estar afastado e a forma como tropeça na bola faz-me lembrar o…sim, adivinharam, o Mariano.

É verdade que Atsu é o “jogador da moda” para quem gosta de futebol, ao passo que James continua a ser o “menino da moda” para todas as meninas (ouviram os guinchos quando entrou? pensei que estava num concerto dos Jonas Brothers tal foi a gritaria em timbre agudo), mas Varela não me oferece uma alternativa ao ganês quando está no banco. A mudança entre os dois não foi visualmente intensa, porque para além de serem parecidos ao longe, até as camisolas acabam em “7”. Mas se Atsu é o 27 e Varela o 17, a diferença em velocidade, ritmo e produtividade é sensivelmente a mesma dos números que usam nas costas. É como mudar de água para vinho, ou neste caso – e perdoem-me a piada rasca – é como mudar de um excelente verde tinto daqueles que deixam marca na malga…para um maduro tinto pobre em taninos e com sabor a rolha.

Desculpa, Silvestre, mas neste momento não acredito em ti. Prova-me o contrário e não me ponhas a gritar o que o meu douto colega do lado disse durante o jogo contra o Guimarães, onde se lembrou do seguinte: “Ao Varela só se tinha de dizer que se ele não jogasse em condições, começávamos a tirar-lhe peças para pôr no Atsu!”. Não ia tão longe. Mas prova-me o contrário, faz-me olhar para ti como uma opção válida, rapaz. Está nas tuas mãos.

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