Ouve lá ó Mister – Benfica

Amigo Vítor,

Vai fazer 19 anos em Novembro. Um rapazola que entrava na sua adolescência cheio de esperança no futuro, sem saber o que eram tróicas ou éfeémeís nem nada que se pareça, dirige-se orgulhosamente para a porta da bancada central do Estádio das Antas com o seu cartão de sócio recentemente recebido e revestido do melhor plástico para forrar livros da escola que conseguiu encontrar. Ao lado, um amigo, o amigo de sempre daquelas andanças, com quem costumava falar da bola e às vezes até de outras coisas, como a gaja gira que tinha aulas na sala ao lado e que até trazia calças apertadas, a boazona. Já pelo caminho, enquanto absorviam o ambiente dos grandes jogos, iam discutindo se devia ser Kostadinov a jogar ao lado de Domingos ou se valia a pena usar aquele puto, o Paulinho Santos, no meio-campo para travar as corridas do Isaías e do Mostovoi. A teoria fluía lentamente, com vozes ainda a quebrar, sobre a força de João Pinto no flanco direito que contrabalançava com a inépcia de Bandeirinha cinquenta metros ao lado, mas a defesa dava garantias, pá, porque o Alu e o Bicho não deixam ninguém passar, não senhor, nem pelas cuecas da Giselle Bündchen.

E o tempo parecia londrino, Vitor. Uma camada de nevoeiro tão densa que não se via nada a um palmo dos olhos, homem, nem a torre da Igreja das Antas se conseguia ver lá de dentro. Mas os dois destemidos dragões neo-oficializados subiram a rampa, encontraram um lugar no meio do cimento da bancada e lá ficaram a ver o jogo. Ninguém se sentava, carago, o jogo via-se quase sempre de pé, e os corações batiam mais forte quando a equipa entrava. Olha eles, carago, vamos lá malta, POOOOOOOOORTO! gritavam os putos de fora lá para dentro, ansiosos pelo apito e pelo arranque da festa. E o jogo…não se via. E esses catraios, por muito que espreitassem por entre cabeças e casacos e braços erguidos em protesto, não viam. E o desespero apoderava-se das suas mãos, das emoções e dos pés que irrequietos não paravam de tentar circular pelo espaço tão reduzido onde estavam enfiados. Era difícil aguentar.

Nisto, um grito, dois, mil. Um lampejo de vermelho passou pela área e a bola desapareceu na bruma. Pontapé de baliza, marca o árbitro, porque o estádio viu o espesso manto branco a esconder o lance. Penalty, cantavam uns, estás tolo, homem, não vês que mandou a bola ao lado? Desespero, unhas roídas, mãos a tremer. Até que, a dez minutos do fim, o céu limpa-se e os vinte e dois são visíveis. Mais ainda, Jorge Costa irrompe pela área vermelha, é abalroado por Helder e o penalty é bem assinalado. Ah, coração, aguenta, que já falta pouco. Há um louro a caminho da bola. Um discreto e genial romeno que pega na esfera de couro e aninha-a bem lá no fundo das redes do outro rapaz. Loucura nas bancadas e os dois rapazes abraçam-se, abraçam outros, abraçam velhos e novos, altos e baixos, todos comungam da vitória, daquele momento único e que nunca mais se pode esquecer.

No primeiro jogo como sócios, esses dois saíram de lá felizes. Um deles era eu, Vitor. Faz com que hoje aconteça o mesmo.

Sou quem sabes,
Jorge

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Ouve lá ó Mister – Feirense

Amigo Vítor,

Toda a gente pensa que este é um jogo fácil, mesmo que não o admita. Afinal de contas a diferença de orçamentos é só de umas dezenas de milhões de euros e vão estar em campo duas equipas que estavam em divisões diferentes no ano passado e que esta época têm duas perspectivas diametralmente opostas do que podem fazer. A teoria está toda exposta, mas o que é certo é que lá dentro do campo temos de mostrar que a diferença é mesmo do tamanho do Grand Canyon alargado por fórceps.

Ainda assim compreendo que não uses nem o Hulk nem o Palito, mas tem cuidado com as poupanças. Mais uma vez, o Feirense pode ser uma equipa que dá luta mas que está ao nosso alcance, mas acautela-te com os inesperados. Sim, homem, já percebi, vem aí o Benfica e o Zenit e os dois jogos são mais importantes aos olhos dos adeptos e não só, porque se contra o Benfica os pontos valem o mesmo mas o orgulho não, contra os russos o galo já canta como um tenor bem afinado, porque contam os pontos, o guito e o prestígio. Exactamente por isso é que disse que entendo deixares de fora esses dois fulanos, pronto, não te chateies. Mas depois não te chateies também se eu vir o Fucile a inventar ou o Varela a passear como ambos têm vindo a fazer. Espeta-lhes os alfinetes que quiseres, mas tens de saber que eles sabem que só jogam porque puseste os outros a descansar e por isso tens de lhes provar o contrário e convencê-los que é em jogos destes que os bons jogadores são sempre bons. Diz-lhes assim: “Ouçam lá, mas acham que o Ronaldo só joga bem contra o Barcelona? E o Osasuna? E o Unión Deportiva de la Pentellada? Os bons são sempre bons, carago!”. E aproveita o James, que o rapaz está a jogar que parece que está possuído pelo espírito do Timofte mas em rápido. E moreno. E a falar espanhol. E sem ter um primeiro nome que parece um motor de um filme de ficção científica. Mas tirando isso, é igualzinho!

Só para acabar, volto a virar as agulhas para o nosso adversário. Não te admito que percas contra uma equipa que tem jogadores chamados Stopira, Siaka Bamba, Uanderson e Ludovic. Temos de manter a integridade, carago!!!

Sou quem sabes,
Jorge

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Ouve lá ó Mister – Shakhtar Donetsk

Amigo Vítor,

Estamos todos impressionados. A segunda parte contra o Setúbal parecia tirada do “Manual de Bem Atacar com Bola” e estava entusiasmado a ver o jogo. Gostaste do “James e os Três Anões”? Acho que me saiu bem, pá, vou usar essa outra vez no futuro se me deres hipótese para tal.

Mas este jogo não vai ser igual ao de sexta-feira, pelo contrário. Vamos esquecer por agora os Necas, Hugos Leais, Brunos Amaros e Pitbúis e focar no Jádson, Willian, Fernandinho e Srna. E mais alguns que jogam com muita cabeça mas que aguentam noventa minutos ali a correr muito e pelos sítios certos. São gajos experientes e tens de lhes acertar como o bom jogador de sueca que nunca deixa entender que mão está a segurar (sim, sueca, nem todos se venderam ao poker) para poder depois agredi-los com um valete de espadas onde mais dói. Exactamente, no bolso. E sei que gostaste de ver Defour-Moutinho-Belluschi no meio campo mas se calhar pode não ser boa ideia começar por aí. Se fosse a ti punha o Fernando para arrancar as hostilidades e depois…vês no que dá. É que estes jogos são tramados, qualquer falha na defesa e vem por aí fora uma horda de brasileiros para o contra-ataque e está o caldo entornado. Somos bons, mas eles também são.

E acima de tudo, Vítor, é jogo de Champions’. O teu desfloramento nestas coisas de jogos europeus e aposto que como todos nós na bancada vais sentir aquele arrepio quando começares a ouvir a música a ecoar no Dragão. É lindo ver o estádio cheio de estrelas porque a Liga Europa é muito gira mas não é a mesma coisa e a malta sabe que é aqui que quer estar todos os anos. Lembra-te do ano passado, com equipas como o Besiktas, o Rapid Viena e o CSKA de Sófia. Este ano apanhamos três campeões, que só nós e o…Barcelona se podem gabar de ter no grupo como cabeças-de-série. É bonito estar aqui, homem, é muito bonito. Mas ainda mais gostoso é começar esta primeira série de seis jogos com uma vitória. Conto contigo.

Sou quem sabes,
Jorge

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Ouve lá ó Mister – Vitória Setúbal

Amigo Vítor,

 

Mas que bela encavadela saiu da Marinha Grande, homem! Olha que um gajo assim começa-se a habituar a goleadas e como eu sei que tu sabes que jogos com sete golos não acontecem todos os dias, só podemos ficar contentes com o festival que deste na terça-feira. E agora, vem ao Dragão os próximos cordeiros para o sacrifício. Ou não?

Não. Cuidado com estes fulanos. Ah e tal porque são lá de baixo e da terra de bom peixe e coiso e até costumam apanhar no trombil sempre que cá aparecem em cima com as camisolinhas alternativas porque o verde-e-branco às riscas parece que choca com o nosso garboso azul-e-branco e lá vêm eles com os amarelos fluorescentes ou laranja-psd ou rosa-chok que até fere a vistinha, e pumba, siga para o 3-0 que se faz tarde. Nada disso. Estou à espera de mais um jogo tramado contra defesas rijos, médios experientes e avançados rápidos. E o Pitbull, esse zénite da nomenclatura masculina brasileira que não está longe do Alessandro Cambalhota ou do Paulinho McLaren em termos de alcunha, mas que joga e faz jogar melhor do que parece; e também tens o Hugo Leal, que desde o Souness tem vindo sempre a descer na carreira (tirando o ano que passou no Dragão, o melhor da vida dele só pela honra que teve de usar a nossa camisola porque campeonato…nicles); ou o Neca e o José Pedro, dois produtos da escola de futebol do “deixa-te andar” que são jeitosos mas não muito; o Ney, que deu cabo das pernas ao Hulk na Amadora; o Miguelito, que é só um enjoo de nervosismo e maus cruzamentos; e o Ricardo, pá. O Ricardo, carago, o primeiro central do FC Porto que vi a jogar sem rins, o homem que demorava mais tempo a rodar que um relógio parado e que se andou a armar em parvo no Boavista e agora no Setúbal. Herege do carago, havia de comer cascas de melancia seca durante uma semana só pela ingratidão. Quero que todas as equipas onde esse gajo jogue percam por doze a zero. Não gosto do gajo, pronto, que queres que faça?

Mas virando-nos para a nossa equipa, que é o que interessa, os meus parabéns pela coragem que tiveste em deixar de fora o Varela. Nota-se a milhas que o rapaz não anda bem e como sempre que entra em campo acaba por levar assobiadelas (merecidas ou não, já depende do ponto de vista), fizeste bem em deixá-lo de fora para não o queimar. E há que tentar puxar pelo James, para que não se fique só pelo jogo contra o Leiria que foi muito porreiro mas é preciso continuar sem deixar cair no chão. E o Kleber também precisa de confirmar o arranque, vê lá se pões o moço a chutar mais vezes à baliza para não se tornar num Postiga.

Enfim, sejam quais forem as tuas decisões, o que interessa é ganhar o jogo. Terça-feira ainda está longe e o que interessa é que eu saia do Dragão bem-disposto. Mai nada.

 

Sou quem sabes,
Jorge

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