Ponto de situação – jogadores


A culpa de qualquer sequência de más exibições e maus resultados não pode nunca morrer solteirona e enfiada num palacete na Foz. Para perceber o que se passa precisava de um ou dois dias a conversar com o treinador, a equipa técnica e os jogadores em sessões à terapeuta de filmes amaricanos, com caderninho de notas e um sofá com um homem esparramado a fazer jorrar a alma para fora. À míngua de tempo, pachorra e um passe para os bastidores no Olival, limitar-me-ei ao que vejo em campo.

Os rapazes não parecem os mesmos. É um facto, não uma especulação. Seja por que motivo fôr, mas quando olhamos para o campo e vemos os nossos homens a correr para controlar a bola (ou nos tempos que correm, a andar à espera que a bola os controle a eles), há qualquer coisa que não está de acordo com o que sabemos que podem fazer. E por muitas voltas que dê à cabeça não consigo entender porquê. Haverá algo que os incomoda? Que os faz não querer, não lutar, não largar o corpo, a pele ou o pâncreas em campo para conseguir dar a volta a situações repetidamente negativas? Não entendo, palavra.

A maior parte das pessoas acede a estereótipos fáceis e tira ilações precipitadas sobre os porquês, especialmente quando se fala de jogadores. Ou porque o empresário diz que o jogador está insatisfeito (como já abordei no passado e aproveito para citar o João Saraiva no Reflexão, não há maneira de exterminar esta gente?), sem sequer ouvirmos declarações do próprio jogador, ou porque o jornal B ou R (as letras são aleatórias…wink wink) insinua que trinta clubes italianos e doze búlgaros pretendem adquirir um dos craques que estão tão evidentemente à venda, ou então pela falta de novos objectivos na carreira enquanto portistas, qualquer destes motivos aberrantes são usados por gente de má índole ou apenas para se poder dizer mal de tudo e todos e esquecer o problema e a melhor maneira de o resolver. Os jogadores, é um facto, não estão a jogar o que devem. Mas daí a agarrar em tudo o que se pode, do cabelo do Hulk ao bigode do Rui Quinta, passando pela careca do Semedo e do investimento em jogadores que ainda nem cá chegaram, tudo serve para atirar mais uma acendalha na fogueira que vai sendo afagada debaixo do plantel e desconsiderar uma reflexão sobre os motivos desta baixa de forma colectiva.

No entanto, não deixa de ser uma verdade que quando vemos Moutinho a falhar passes consecutivos, Varela sem velocidade para passar por um débil defesa em corrida, Hulk a perder bolas para a relva, James expulso por agredir um adversário, Fucile a fazer com a mão o que devia fazer com o pé, Otamendi a fintar-se sozinho ou Guarín perdido em marcações fáceis, é de levar as mãos à cabeça e perguntar: “O que se passa, rapazes? Vocês, que nos deram o prazer de vos vermos a jogar durante uma temporada inteira a um nível elevado, são capazes de tanto melhor do que têm mostrado…e não arrebitam? Não levantam a cabeça? Desistem, perdem tino e abdicam de lutar?”

E é o que tenho visto. Para lá de todas as especulações sobre salários, motivações e paleio de empresários, o que me salta à vista é a falta de um líder. Seja dentro ou fora de campo, qualquer equipa funciona tão bem quanto o seu líder lhes impuser que funcione. E se no ano passado o líder estava no banco com a braçadeira de treinador principal e o que a tem este ano se sentava a seu lado, quando a promoção foi feita parece ter-se esfumado alguma da garra, da verve com que os jogadores entravam em campo e degolavam o cangote do próximo na fila. Dizia-me um amigo hoje que os jogadores do FC Porto olham para Vitor Pereira como os putos na escola olham para um professor substituto, que aparece de quando em vez numa altura em que o regente da cadeira (ou disciplina ou lá como se chama agora) está ausente. Os rapazes são os mesmos, o novo professor já os conhece de outras andanças, até os acompanhou quando a micose afectou o delicado escroto do antecessor, mas o respeito que se ganha a pulso não está lá, ou pelo menos não se vê.

Mas não só. É inconcebível e inexplicável aos olhos de um adepto reparar, como aconteceu no Chipre, que o brio de muitos tenha caído tanto. Que o orgulho não suba como o azeite e prove que os grandes jogadores que compõem as grandes equipas também têm de ser esforçados, por muito que o exemplo de Capucho nos venha tolher a memória. É preciso mais fibra, mais luta, mais esforço, mais respeito. Quando estes quatro pilares forem atingidos a um nível aceitável, não tenham dúvidas: o talento sairá do bunker onde tem estado escondido e brotará da cabeça aos pés daqueles miúdos. Só espero que ainda consigamos chegar lá a tempo.

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