Lucho tem tudo para ser o Aimar do FC Porto

É um dos jogadores com maior experiência do plantel. Os adeptos respondem à sua presença como um miúdo com um cheque prenda em branco numa loja da Hussel e quando chegou em Janeiro foi imediatamente re-elevado à condição de herói da naçom que tinha mesmo depois de sair para o Marselha, ele que foi mais um numa longa lista de jogadores que optou por sair para aumentar o fundo de maneio que terá à sua disposição nos “golden years”. Nada contra, até porque foi campeão em França e para além de encher os bolsos com euros que têm um hexágono nas costas acabou também por mostrar toda a qualidade por terras de De Gaulle. Carlinhos, prós amigos. Voltou, com uma aura que equivale ao seu valor e ao impacto que sempre teve nos sócios e simpatizantes do FC Porto.

Mas por muito que se queira (e quer) que Lucho seja o mesmo, já não é. Pelo menos por agora ainda não conseguiu ser. O talento está lá, não haja dúvida, mas a influência que tem no jogo faz-se notar durante menos tempo e com menos impacto. Ele não tem culpa, entenda-se, Lucho faz o que pode, coordena a equipa em campo como o “comandante” que sempre foi e será, mas tem limitações físicas que parecem evidentes a todos. Lucho, neste momento, é um jogador para aguentar 60, 70 minutos no máximo, e a partir daí desaparece do jogo, exausto, incapaz de ordenar as pernas a movimentarem-se nos espaços que calcorreava com a intensidade que o fazia quando foi tetracampeão no FC Porto entre 2005/2006 e 2008/2009.

A chegada de Lucho veio tornar ainda mais notórias as lacunas no meio-campo do FC Porto. Não pela sua ausência quando não está em campo mas precisamente pela sua presença e pela incapacidade que o actual plantel denota em preencher uma vaga que durante um terço do jogo se torna óbvio que necessita de sangue fresco. Sempre que vejo Lucho a definhar, como foi evidente em Paços de Ferreira e já o tinha sido na Madeira ou no Dragão contra a Académica, olho para o banco e não vejo ninguém que possa calçar aquelas botas naquela posição. James, dir-me-ão, pode fazer o mesmo que Lucho. Não pode. Pode tentar, mas não é a mesma coisa. Mas, Jorge, não há ninguém que seja “a mesma coisa”, Lucho é Lucho! Certo. No entanto, quando o argentino estava mais em baixo de forma ou lesionado, sempre tivemos uma opção alternativa. Fosse Diego, Anderson, Ibson ou até Mariano (uma adaptação, é verdade), todos conseguiram entrar para aquele lugar porque conseguiam a mistura adequada de suor e inteligência competitiva para evitar que se notasse em demasia a falta do capitão.

Conseguem ver alguém no plantel com essas características? Talvez James, mais nenhum. Então qual é a solução? Lucho começa a fazer apenas sessenta minutos por jogo (como Meireles durante vários anos) e é colocado o colombiano na sua posição, injectado de seja lá que composto quiserem que lhe dê mais garra e força. Como Aimar no Benfica, que quando joga mostra que a qualidade e a quantidade nem sempre são equivalentes (se exceptuarmos a patada do último fim-de-semana, que em Aimar não é normal) e consegue fazer em quinze ou vinte minutos o que trezentos jogadores não conseguirão fazer na vida toda.

Consigo ver Lucho a fazer este papel. Não me importo nada de o ver apenas meio jogo se essa metade fôr produtiva. Caso contrário arriscamo-nos a ver o lento definhar de um talento fantástico. E só temos a perder com isso, tanto nós como ele.

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Três

Lucho está de volta e baixou cinco valores. Nas costas, pelo menos, porque o oito está agora a ser usado por João Moutinho, o que levou Lucho a escolher o três. A história do número três no FC Porto é longa e com algumas nuances curiosas. Aqui estão os detentores dessa camisola desde que a numeração foi tornada fixa em 1995/1996:

 

1995/1996 Rui Jorge
1996/1997 Rui Jorge
1997/1998 Rui Jorge
1998/1999 Fernando Nélson
1999/2000 Rubens Júnior
2000/2001 Fernando Nélson
2001/2002
2002/2003 Pedro Emanuel
2003/2004 Pedro Emanuel
2004/2005 Pedro Emanuel
2005/2006 Ricardo Costa
2006/2007 Pepe
2007/2008 Pedro Emanuel
2008/2009 Pedro Emanuel
2009/2010 Raul Meireles
2010/2011
2011/2012 Lucho González
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Panem et circenses

Chegou Danilo, juntam-se agora Lucho e Janko, sairam já Walter e Fucile para o Brasil e zarpam Belluschi e Guarín para Itália. Soa a uma revolução na mentalidade de um conjunto de jogadores que provaram não conseguir criar uma estrutura coesa em campo para equivaler aos desafios que no pós-zénite de Dublin lhes foram colocados. A aposta nestas duas contratações de último dia trazem dois pontos que não poderão ser contestados: é uma assunção de falha pela parte da cúpula na planificação da época pelo risco da aposta exacerbada em Kleber/Walter para a solução ofensiva central; é também uma inversão pontual da estratégia de vários anos para provocar uma mudança de atitude para os próximos cinco meses.

É, mas não só.

Lucho é um negócio imperdível, tanto do ponto de vista de investimento para um presente que se quer melhor e mais consistente como para um futuro próximo com liderança e inteligência em campo que Belluschi nunca conseguiu e Guarín, a espaços e fundamentalmente na segunda parte da época passada, ainda chegou a fazer crer que iria providenciar. É circo, dirão, é uma manobra para amaciar adeptos e moralizar o público. Evidente. E dirão com toda a razão. Mas acaba por ser uma opção que se torna impossível de abdicar quando a vontade do jogador se junta à tremenda necessidade de alguém que consiga ligar as transições tácticas do meio-campo para o ataque, ainda que num estilo que se quer diferente do que executava na altura em que por cá andou. O plantel, a equipa que Lucho encontra é radicalmente diferente daquela que deixou no verão de 2009 quando rumou a Marselha. A muleta que tinha em Meireles tem agora menos uns centímetros e menos força, o avançado rápido e letal que encontrava nos espaços frontais continua na Ligue 1 e só quatro são caras conhecidas no onze para onde vai rapidamente entrar. Mas Lucho pode ser uma chave importante não para recriar o estilo de Jesualdo com os passes rápidos e as desmarcações cruzadas, mas aproveitando a experiência e o talento do argentino continuar a progredir numa estratégia de passe curto e um jogo de posse que deveria pautar cada vez mais o nosso jogo. Vários jogos já vimos em que a equipa não só entrou desagregada como acabou por se dissolver na relva como um grupo de putos com mente fraca em corpo são e a esperança que Lucho sirva para criar um espírito renovado e pautado pela sua própria força está na cabeça de todos os adeptos.

Janko é diferente. Para além das óbvias limitações financeiras que terão ou não impedido a contratação de outro nome, o austríaco chega sob pressão. O nome não entusiasma, a nacionalidade muito menos, a ausência da Liga Europa é infeliz, os valores são riscados como banais e os golos apontados não levantam o sobrolho. É uma aposta, mais uma entre muitas, num jogador que não creio reunirá grande consenso mas tem a vantagem de também não agregar o binómio nome/reputação de tal forma que leve os adeptos a pensar em golos de cinco em cinco minutos. E apelando ao meu próprio rácio de optimismo e pessimismo, não posso esquecer que houve um Kaviedes para cada Jardel, um Pizzi para um Falcao ou um Mielcarski para um McCarthy. É simples: não há pontas-de-lança que garantam golos per se. E do que conheço de Janko, do ponto de vista do tipo de jogo que gostava de ver no FC Porto, não encaixa. Mas eu não conheço Janko por aí fora e por muito que o rapaz tenha a infelicidade do apelido em lusa língua ter de evitar a rima caso não funcione, a verdade é que terá de jogar sem período de adaptação, a frio, no lube available. E pode doer se não puser a bola no fundo das redes vezes suficientes para reclamar o crédito.

São negócios de inverno, quase sempre feitos para corrigir problemas, adaptar estratégias e alterar posicionamentos. São feitos em cima da hora, fruto de ganância de empresários, pressões de jogadores e impulsividade de treinadores. A gestão destes negócios está a ser feita de dentro para fora, numa óbvia tentativa de controlo de estragos para evitar o total alheamento dos adeptos até ao fim da temporada e ganhar um balão de ar e adiar próximas manifestações públicas de desagrado.

Talvez, mas não só. Algo está diferente no FC Porto. E um optimista, como eu, quer sempre ver mais pão que circo.

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