Ouve lá ó Mister – Rio Ave


Amigo Vítor,

Agora que o campeonato luso está definido um pouco como o Lineker fez ao campeonato do Mundo com o FC Porto a fazer o papel dos indefectíveis teutónicos, chega a altura do último jogo e por muito que queira manter uma cara séria, é-me difícil tentar perceber se hoje vamos ter um jogo a brincar ou se realmente os rapazes que vais fazer subir ao relvado não estão já com a cabeça em mojitos, areia e fins de tarde solarengos só de avental e um fogareiro com as brasas bem acesas e dez nacos de carne na grelha. Chama-me louco mas não me acredito que nenhum deles pense em mais que um treino ao fim da tarde sob o sol de Vila do Conde.

E tu…também acredito na mesma coisa. Por isso é que não me preocupo muito com o resultado de hoje e apesar de ninguém querer perder mesmo a fechar o proverbial pano, estou convencido que metade dos portistas nem se vai preocupar em ver o jogo. Eu vou ver porque sou uma pessoa doente da cabeça mas disso já sabes porque já viste do que a casa gasta e nem aquele jogo-treino contra o Tourizense que costuma marcar o arranque das nossas pré-épocas me passa ao lado.

De maneira que sugiro que os mandes lá para dentro para se entreterem. O Brito vai fazer o mesmo, vais ver, porque ninguém quer agora lesões nem chatices, por isso tentem fazer meia-dúzia de jogadas bonitas e depois vão todos jantar ao Cangalho ou ao Ramón, tirem a barriga de misérias e façam do futebol a festa que todos queremos que seja. E aproveita para ir de férias descansado, deixa que o balanço faz-se mais tarde. E um dia destes vou aparecer lá por Espinho para te dar um abraço, rapaz. Mereceste.

Sou quem sabes,
Jorge

 

APOSTAS PARA HOJE NA DHOZE:

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Tempos modernos

No sábado à noite, depois de terminado o jogo e enquanto esperávamos que os jogadores se vestissem, retocassem a pintura que ostentavam nos respectivos focinhos, pintassem os focinhinhos dos filhos e sacassem as bandeiras de todos os cacifos onde as guardam religiosamente (ou talvez não, talvez tenham dado um salto ali a Mouzinho da Silveira ao cimo da Rua de S.João e compraram a do seu país com o orgulho estampado no rosto…é bom sonhar, não é?), íamos conversando nas bancadas, a única coisa que podíamos fazer até a festa per se começar. Não me interessam minimamente as performances dos miúdos que aparecem no relvado para brilhar com os pom-poms todos em riste e os vestidos fúcsia brilhantes nas luzes do estádio…todos esses deprimentes sucedâneos que têm tanto de futebol como eu de artista plástico. Fiquei até ao fim para prestar a minha homenagem a jogadores e treinadores, aos que me fazem deslocar ao estádio para os ver, que me põem rouco com gritos de incentivo e que de facto fazem de mim portista.

Estava em boa companhia, devo dizer. Amigos portistas de longa data, tinha na minha presença o meu passado e presente de vida azul-e-branca. O puto que comigo foi puto e que também comigo ia até às Antas no início dos mil-nove-e-noventas para criticar Ivic e aplaudir Robson estava lá comigo, numa reunião que teve tanto de nostálgica como de natural. O meu amigo “do costume”, companheiro de tantas andanças da bola, colega de chuvadas mil e o primeiro abraço depois do golo azul-e-branco. E junto a estes dois de sempre mais um, o meu companheiro em Dublin que este ano finalmente se decidiu a comprar o lugar anual e lá está sempre perto para a conversa do costume. Boa gente a marcar bons momentos. E maus, quando aparecem.

Falávamos da festa, da diferença desta festa para as antigas. Naquele tempo em que os jogos que terminavam a temporada eram vividos como uma festa do povo e o povo era outro. Há palcos pré-fabricados com publicidade no tampo; stewards na altura só se fossem bombeiros ou polícias e nada de cordas a separar o público dos seus heróis. Havia poucas danças, pouco fogo-de-artifício, nenhum efeito cénico e artístico. E a nostalgia lá mostrou a cara de novo e recordávamos como o campo parecia inclinado durante os últimos cinco minutos, a pender para o lado do túnel como um verdejante prado numa encosta solarenga…com um túnel perto de uma das suas laterais. Os atletas, fortes, autoritários, vedetas, encolhiam-se para perto da trajectória mais curta para uma rápida fuga para o balneário, para longe dos adeptos loucos que cedo correriam pela relva onde minutos antes tinham visto os ídolos a desempenhar a função que pagavam para ver. Uns lá conseguiam a recordação na forma de uma camisola, uma chuteira ou um par de meias. Ou só uma, qualquer coisa servia para levar para casa e mostrar à família. Era ver jogadores de cuecas, balizas partidas, redes desfeitas, jovens com pedaços de relva nas mãos e placards publicitários calcados. Era uma festa orgiástica de simbiose de mentes e almas, de união entre adeptos e jogadores com a luxúria da proximidade ao êxito a extravasar por todos os poros. Era belo, era humano, era vida.

Hoje em dia o espectáculo é bonito mas estéril. Grandioso mas frio. Produzido mas distante. É um enorme circo feito para shares de facebook e malta que aparece uma vez por ano para bater palmas e que não faz ideia quem joga nas outras vinte-e-nove (ou serão 33?) jornadas.

Tive a sorte de poder viver as duas situações. E quem como eu também o fez, aposto que gostava mais da maneira antiga.

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Baías e Baronis – FC Porto 2 vs 0 Sporting CP

Uma festa é sempre bonita quando a celebração do título é feita em nossa casa. E contra o Sporting ainda parece que acrescenta qualquer coisa à alegria, porque ver aqueles moços a fazer pela vida dá-me uma vontade enorme de ganhar o jogo e empurrá-los para fora da Champions, como aconteceu. Que diabos, se fizeram uma carreira tão vistosa na Liga Europa, com um ferrolho tão grande como as portas do templo de Salomão, para o ano vão ter hipótese de repetir a piada. Quanto a nós, continuaremos na prova onde merecemos estar, mas não a 100%. Para ser uma equipa de Champions temos de ser muito melhores, mais consistentes, mais fortes, mais eficazes, mais…tanta coisa. James e Varela têm de ser mais dinâmicos. Alex Sandro mais atento. Janko mais eficaz. Otamendi mais certeiro. Hulk mais prático. Mas não foi mau, especialmente num jogo em que houve mais tinta branca na cara dos nossos moços que nos bastidores do Batatoon. Enfim, vamos às penúltimas notas da época:

 

(+) Hulk Sete golos nos últimos quatro jogos, uma dinâmica incrível dada ao ataque, alguns assobios, dezenas de sprints, outras tantas de bolas perdidas, assistências para golo, remates fortes…the works. É o grande jogador do FC Porto 2011/2012 a vários quilómetros de todos os outros e continua a fazer por merecê-lo. É curioso perceber que Hulk tem a noção correcta da influência que tem perante os sócios que o apoiam e vaiam em momentos distintos do mesmo jogo e só precisa de tentar encontrar um melhor equilíbrio entre o timing certo para rematar e para passar. Nem sempre o consegue e perde várias jogadas de perigo dessa forma…mas depois sai-se com golos como o segundo de hoje, pleno de inteligência e capacidade física depois de 80 e muitos minutos a jogar em alto nível, a rasgar pela depauperada linha defensiva do Sporting como se fosse um berbequim a furar gelatina. Grande jogo.

(+) Maicon Perfeito no corte, no controlo da zona defensiva e no autoritarismo com que lidou com Van Frunkelstrinkel. Manteve-se constantemente atento, vivo, mexido, ágil e agressivo nos momentos certos com posicionamento perfeito, intercepções atempadas e domínio de bola prático e eficiente. Para quem não percebeu e pensa que estou a gozar com a tropa, esta secção refere-se ao número quatro do FC Porto, Maicon de nome, defesa-central de posição. Está a melhorar muito em relação ao Maicon do ano passado e é talvez o melhor produto saído das mãos de Vitor Pereira. Uma espécie de anti-Varela, pronto.

(+) A saída de Fernando depois da expulsão O maior. Foi uma simbiose perfeita com os adeptos, que cantam o seu nome depois de um início de temporada que enervou toda a gente pelo desconhecimento da sua permanência ou não no plantel. Para quem não viu ou não reparou, depois de Fernando ser expulso (bem, apesar do primeiro amarelo ser completamente escusado pelos protestos exagerados) mandou um pontapé na bola para a bancada e procedeu a sair de campo a incentivar o público para continuar a gritar e a apoiar, gesticulando como se estivesse a dançar com uma data de miúdos num ATL. Brincou, o nosso Fernando, ao contrário do que fez em campo, onde fez mais um bom jogo, firme e seguro contra um meio-campo adversário bem mais dinâmico e mexido. Aplaudi-o de pé. Mereceu.

 

(-) A frustrante e contínua incapacidade técnica É uma enorme frustração ver que jogadores do nível dos nossos, que são campeões (alguns bi, outros tri, até chegar a um que é hexa, vejam lá!), titulares de uma das maiores equipas de Portugal e da Europa…e tratam a bola como se ela fosse um daqueles maços de ferro antigos com esferas cheias de picos. Sei que todos os homens são iguais mas uns são mais iguais que outros por isso apercebo-me que nem todos podem ser Messis. Mas não precisamos de tantos Marianos, porra! Fernando raramente consegue controlar a bola de primeira, Varela insiste em fazê-la saltar doze vezes antes de a colocar na relva, Otamendi passa a bola com mais força que Belluschi a rematava e Janko não acerta na baliza a mais de três metros da linha. Só com treino é que se vai lá, teoricamente, mas começo a perder a esperança de alguma vez poder ter uma equipa tecnicamente ao nível da de Mourinho em 2004. Será pedir demais? Talvez. mas continuo a pedir.

 

Mais um jogo para acabar esta treta. Em Vila do Conde estaria disposto a ver uma equipa com Kadu, Iturbe, Djalma, Kleber, Mangala, Danilo…e mais alguns juniores. Estes rapazes não fizeram a melhor temporada da vida deles mas já podem ir de férias. O dever foi cumprido, com maior ou menor brilho, e ainda hoje conseguiram dar a imagem de uma equipa lutadora, empenhada, séria. E o que é certo é que marcamos dez golos nos últimos cinco jogos e sofremos…zero. Vencemos 14 pontos em 18 possíveis contra os “grandes”. É um resultado muito bom e é a marca de uma equipa que se conseguiu erguer e ser mais consistente que as outras. E os campeonatos ganham-se assim.

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