
Qualquer portista que foi hoje ao Dragão ou assistiu ao jogo via SportTV estará neste momento frustrado e triste. Mas desengane-se se pensam que vão ler aqui uma tirada de insultos ao treinador, presidente, estádio, camisolas, relva, enfim, as habituais diatribes exageradas que saem da boca de quem analisa as coisas a quente. O que fica deste jogo é um não-jogo. É o não-jogo que a nossa equipa fez, que mostrou uma inesperada falta de estaleca emocional para dar a volta por cima a uma situação de desvantagem técnica e de dificuldade táctica. O Benfica entrou a pensar em não sofrer golos, agressivo, a tapar bem os espaços e a pressionar alto, e ao contrário do que aconteceu ainda esta época em Viena, ninguém conseguiu acalmar os ânimos e jogar com inteligência e cabeça fria. Falhas individuais sucederam-se, levaram a falhas colectivas e desfizeram uma equipa que nunca pareceu tão igual à que jogou na Grande Implosão do Emirates Stadium. Com todos os clichés no mundo à minha disposição, vou usar o tradicional “é preciso levantar a cabeça e seguir em frente”. Porque se vamos ficar a pensar muito no que se passou, a depressão está ao virar da esquina. Vamos, calmamente, a notas:

(+) Varela De longe o melhor do FC Porto esta noite. Seguiu para a frente pelos dois flancos (direito na primeira parte e esquerdo na segunda) e tentou sempre puxar pelo apoio dos colegas da frente e do lateral que o apoiava, já que o meio-campo fazia apenas figura de corpo presente. Varela tentou muito e acabou o jogo de rastos. Não havia muito mais a fazer.
(+) Sereno Quando o vi a começar a aquecer, pensei que Jesualdo tinha regressado. Uma invenção em jogos grandes normalmente dá borrada, mas neste caso não foi por aqui que a porca torceu o proverbial rabo. Sereno fez hoje mais jus ao nome que em todos os outros jogos em que tinha alinhado desde Julho, agressivo q.b. e a tentar sempre arrastar a equipa para a frente. Só não fez mais porque não sabe o suficiente.
(+) Sapunaru Muito mais coração que cabeça, foi dos poucos que tentou rupturas a arrancar pelo flanco, subindo para ajudar Hulk quando o sentido táctico da equipa era pouco mais que inexistente. Com resultados práticos nulos, diga-se, mas não foi por falta de vontade.
(+) Sentido prático do Benfica Jesus foi o treinador que mais “inventou” no Dragão hoje à noite, especialmente pelo uso de um 4-2-3-1 amarrador, colocando César Peixoto no centro e usando-o para tapar Belluschi ao lado de um Javi Garcia que prendia Moutinho. Com Cardozo a receber muito jogo pelo ar e a prender o amorfo Maicon ao centro, o jogo era facilmente aberto para Sálvio ou Gaitán ou até para Saviola que apareceu muitas vezes na “terra de ninguém”, qual Aimar. O Benfica apareceu para não sofrer golos e não só o conseguiu como enervou os defesas do FC Porto ao ponto de levar a falhas inadmissíveis e produzir um resultado muito bom para a segunda mão. Quando assim é, e mesmo não tendo feito um jogo admirável, há que congratular os vencedores. E acreditem que custou muito dizer isto.

(-) Maicon Com este é o terceiro jogo grande em que Maicon fica ligado a lances que dão golo do adversário ou que levam à sua expulsão e abanam a equipa. Em Alvalade caiu no engodo de Liedson e foi expulso; na Turquia deixou que o avançado o ultrapassasse e foi expulso; hoje, foi a pior exibição de sempre com a nossa camisola, fazendo o suficiente para que Secretário fosse perdoado pela assistência perfeita a Beto Acosta aqui há uns anos. Facilitou não uma vez mas DUAS vezes perante um jogador que nunca desiste dos lances como Coentrão e está ligado aos dois golos do Benfica. A somar a essas duas parvoíces temos mais uma data de erros, de ridículas trocas de bola com Rolando e atrasos permanentes para Helton, levou todos os adeptos a puxar os cabelos de fúria quando perdia bolas fáceis e sentiu-se permanentemente pressionado. Não libertou a pressão e continuou a jogar mal. Muito, mas muito mal.
(-) James Verde. Muito verde para estes jogos que exigem de um jogador uma capacidade de aguentar a pressão acima da média. Depois do tremendo falhanço na área do Benfica foi incapaz de conseguir levantar a cabeça e aparecer em jogo. Passou penosos minutos a olhar para a bola, não tapou o flanco nem apoiou o avançado nem os médios que estavam tapados e desesperadamente à procura de uma mísera linha de passe, deixando-se enredar na malha defensiva do adversário e perdendo duelo após frustrante duelo com Maxi Pereira. Tem de amadurecer muito.
(-) Hulk Não foi o principal culpado da má exibição, mas não ajudou. Aqui culpo um pouco Villas-Boas, como já disse no passado, pela colocação de Hulk no centro, que se assemelha não a um “caçar com gato”, mas a um “caçar com um ornitorrinco manco e leproso” quando enfrenta uma equipa que sabe tapar os espaços. Raramente conseguiu a margem que precisava para arrancar e perdeu-se em infindáveis fintas e fintinhas que enervavam o Papa. O João Paulo, não este rapaz que lá está agora. Na memória fica uma simulação simplesmente absurda que lhe valeu (bem) o amarelo, depois de ganhar espaço a Luisão e decidir voar para a relva. Ah, e perdeu a bola umas 6 ou 7 vezes para o César Peixoto. Não para o Ashley Cole, para o César…Peixoto. Shame, dude.
(-) Letargia e o baixar de braços O principal factor que levou à mais pobre exibição da era Villas-Boas foi a incapacidade mental da equipa. Quando entrámos em campo e o jogo arrancou, cedo se percebeu que ia ter de ser um jogo de paciência, de rotação de bola e de libertação demorada da pressão alta do Benfica. O primeiro golo, fortuito e oferecido, abanou a equipa e começou a cavar a profunda sepultura em que a força de vontade para dar a volta foi enterrada. Quando surgiu o segundo golo, a sepultura foi invadida pelo equivalente moral da tuneladora do Metro do Porto. Nunca mais a equipa se encontrou e começou, ao contrário do que era minimamente exigível, a tentar fazer tudo depressa e, consequentemente, mal. Helton a pontapear bolas para a cabeça de Belluschi; Fernando, tratando a bola como se estivesse descalço a chutar um ouriço a romper passes rasteiros direitinhos a Luisão; Hulk a perder a bola para César Peixoto (não me canso de repetir esta destruição da ordem natural das coisas) e Belluschi a passar a bola para o lado sem olhar. Foi confrangedor ver jogadores que deveriam ter maior capacidade emocional de reagir a adversidades sem pegar no revól
ver e iniciar um jogo de roleta russa com 6 balas na câmara.
Perder contra o Benfica não é nenhuma tragédia, mas a forma como aconteceu deixa qualquer portista infeliz. É fácil, depois do jogo e das decisões tomadas, atacar Villas-Boas pelo critério do não-ponta-de-lança ou da escolha de Sereno em vez de Fucile. Mas há que perceber que o resultado surge depois de uma exibição pobre cheia de nervosismo e com pouca inteligência emocional de uma equipa que já mostrou que é capaz de muito melhor que isto. Villas-Boas, na conferência de imprensa, disse que não espera reflexos desta derrota no próximo jogo do campeonato contra o Rio Ave. Não sei se concordo mas espero pelo próximo Domingo para ver se é ou não verdade…
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