Leitura para um fim-de-semana tranquilo

  • A análise táctica do último jogo do FC Porto contra o Olhanense, no A Bola do Vasco;
  • Numa altura em que o futebol romeno cada vez leva mais portugueses a emigrar, vale a pena perceber como vão as coisas lendo um pouco do Scouting Romania;
  • Jonathan Wilson olha para a muy-confusa fase de qualificação para a CAN 2013;
  • O sinal evidente que mesmo em Inglaterra não conseguem acertar com taxas de câmbio, eles que a usam bem mais que nós. Visto pelo Off the Post;
  • Uma viagem ao longínquo ano de 1995, onde no Canadá a selecção nacional disputava a Skydome Cup, num estádio coberto com piso sintético. A ler com um sorriso nos lábios, no Cromos da Bola;
  • O In Bed with Maradona leva-nos numa visita às planícies bolivianas, para o 159º Clasico Cruceño entre o Club Blooming e o Oriente Petrolero;
  • Um plano com cinco pontos para melhorar a forma como os equipamentos vão sendo alterados ano após ano, no True Colours Football Kits;
  • O que pode valer a rejuvenescida Real Sociedad em 2012/2013, no Diarios de Fútbol;
  • Avançando alguns anos para o futuro, uma visão do que poderá vir a ser a temporada de 2016/17 no futebol inglês, escrito pelos doidos do The Two Unfortunates;
  • Porque os estádios, construídos ou em projecto, são sempre obras magníficas, vale a pena darem uma vista de olhos pelo tumblr genialmente nomeado Stadium Porn;
  • Para terminar, Miguel Lourenço Pereira no seu Em Jogo estuda o futuro da Liga portuguesa numa altura em que algumas das principais figuras vão saindo para outros pastos;
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Advertising lullaby

George Carlin tinha um jeito para as palavras como nenhum outro stand-up comic. E das horas que já passei a ouvi-lo, onde memorizei sem forçar alguns dos textos que este brilhante homem vociferou ao longo das décadas de carreira, há uma secção em particular que associo imediatamente à forma como muita gente que lê a imprensa desportiva portuguesa se deve sentir ao folhear pelas maravilhosas não-notícias e apontamentos editoriais que são impressos nos jornais ou surgem pelas ditosas vozes dos…aham…jornalistas. Aqui está:

Ouçam deste o início, mas fica o aviso: a piéce de resistance está aí pelos 2:17.

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Túneis de realidade

Robert Anton Wilson, um escritor/orador/filósofo/psicólogo americano do século XX, usava o termo “reality tunnel” para explicar que o que alguém vê não é necessariamente o que existe, mas apenas o que existe aos seus próprios olhos. É algo que pode ser bem explanado em português coloquial como “quem o feio ama, bonito lhe parece”. Mostra bem a forma como algo que para quase todos os comuns mortais pode parecer um movimento peristáltico de Pollock, quando visto através de outros olhos pode perfeitamente aparentar uma obra de Boticelli.

O mesmo se passa no futebol, a outro nível. À medida que as notícias iam avançando sobre a venda de Hulk, as comparações com a venda de Witsel, pelo mesmo valor, por menos valor, por um valor mais disperso, com ditórios e contraditórios a serem disparados por todas as partes interessadas desde o SEF ao Tribunal de Contas russo, passando até (ignomínia!) pelos próprios clubes que estiveram envolvidos nas transacções, vejo-me a olhar para todo este espectáculo circense com a atenção de um miúdo numa aula de Matemática. Enquanto passo as vistas pelos jornais desportivos, cada um a puxar para seu lado numa manifestação parva de comercialismo bacoco que a maior parte devora com avidez e engole todas as notícias com cunho editorial bem presente que lhes são enfiadas pelas goelas, reparo que raro é o indivíduo que fala do que realmente devia interessar a um adepto de futebol: perderam-se dois excelentes valores no campeonato. E alheando-me do belga, cuja saída só me diz respeito porque enfraquece um rival, tento-me focar no nosso interior, no que temos à mão para suprir a falta de um elemento pivotal de há anos a esta parte. E procuro informação, busco inspiração a blogues amigos, a outros não-tão-amigos, falo com A, K, X, mas todos falam do mesmo. Das contas, dos 13.7% que foram parar ao fundo de protecção do coalas albinos e mais 0.49% + IVA que seguiram para a empregada de limpeza, do gajo que custou mais apesar de ter custado menos, das percentagens das comissões, dos incendiários que avançam com catana em riste para terminar com luvas brancas, sujas da imundície a que estão habituados. Os comunicados, para cá e para lá, as piadas, as insinuações, a risota, a loucura. O futebol, aquele da relva e das balizas, esse deixa-se para segundo plano, como de costume. Devo ser dos poucos que se está a obrar para as contas. Palavra. Essa treta de bater no peito quando se fazem mais uns trocos que outros não é para mim. Já foi, pois já, mas cresci. Evoluí, talvez seja o termo mais adequado.

E no meio deste puro desterro da nossa não-cultura futebolística, enfia-se um castigo. Torpe, fraco, pobre de espírito, incapaz de punir o que deve ser punido, seja qual fôr o tom da camisola que ostenta. E já nem surpreende a forma como este tipo de actos se vão repetindo no nosso quinhão de terra arrancado a romanos, sarracenos ou castelhanos. Tudo é previsível, frio, sem alma, sem vigor nem justiça, onde todos dizem o que querem quando querem e ninguém está disposto a pôr as botas no chão e dizer “basta!”. São estes os túneis de realidade de que falava no início. São estas as visões próprias de quem só tem a sua visão, quem olha para o que quer e se sente desfasado porque estão todos a olhar para outro lado. E a pureza que eu, o ingénuo, ainda acredita que possa vir a vingar, não conta.

E se há alguém com motivos para estar triste perante toda esta enormidade de parvoíces, não é o Ronaldo. Sou eu.

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Hulk

Lembro-me de estar sentado no Dragão numa solarenga tarde de Verão em 2008. Na altura, um desconhecido brasileiro com uma das mais ridículas alcunhas dos últimos tempos estava em campo a envergar uma camisola pouco usual para avançados. Com o doze nas costas, Givanildo transformou-se numa das melhores e mais importantes aquisições do FC Porto desde que sou portista, um homem que tem o dom de fazer estádios levantar, de levar adeptos à euforia numas alturas e à profunda irascibilidade noutras tantas. Hulk mudou o jogo das equipas de que fez parte, atravessou três treinadores e conquistou montanhas de títulos, tanto individuais como colectivos. Tornou-se na imagem do clube, na figura que atravessava mundo com a nossa camisola e que mediatizou ainda mais a nossa equipa em competições nacionais e europeias.

Hulk é a imagem da influência que um jogador pode ter uma equipa, por muito que essa mesma equipa seja de um nível já bem alto na habitual escada do sucesso. Poucos jogadores, no decorrer da minha própria carreira como adepto portista, vi com a mesma capacidade de revolucionar um jogo morto, de trazer vida a um ataque insipiente, de mudar o desfecho de uma partida com a força, a velocidade, a potência que aplicava em todas as jogadas de que fazia parte. À imagem de Deco ou Quaresma, em tantos e tantos jogos a equipa dependia dele e ele era a equipa. Era para ele que todos olhavam, dentro e fora de campo, como o enorme martelo que parte o cubo de Rubik quando já ninguém tem pachorra para encaixar nas posições certas. Era Hulk, era quase sempre Hulk, o actor principal em filmes vistos vezes sem conta, quando a equipa não tem pernas nem inspiração para trabalhar de uma forma produtiva para que o resultado fosse parecido com o que os adeptos sempre procuram. Era Hulk que pegava nesse difícil facho da responsabilidade e zarpava para o ataque com todo o resto da equipa por trás dele, despreocupada, inflexível, confiante que o colega conseguiria um remate indefensável, uma aceleração inatingível ou uma finta letal. Hulk foi vezes demais a figura da equipa, uma imagem de dependência que nos habituámos a ver durante anos seguidos e que, por força do destino e de meia-dúzia de bem arquitectadas minúcias, nos deixou durante meses e nos fez perder um campeonato que podíamos e talvez devíamos ter ganho.

Era também um invulgar motivo de discórdia. As atitudes furiosas, o constante questionar das decisões do árbitro, os lances após lances que perdia quando tentava fazer algo impossível até para ele, as decisões erradas do “chutar quando deve passar” e vice-versa, os livres para a bancada, os amuos, as críticas, os lamentos. Mas era sempre um dos que chegava ao fim do jogo com a camisola a pingar do suor de um lutador, de um headliner que sempre o foi e sempre quis ser. E na nossa memória, na memória de todos nós que daqui a uns anos vamos falar com os nossos filhos e netos e dizer-lhes que houve um brasileiro que era uma montanha de força e que usou a nossa camisola durante quatro anos, vamos todos recordar os cincazero ao Benfica, os slaloms em Donetsk, Madrid, Moscovo, Sofia, Lisboa e Porto, os golos na Champions, os remates de longe, as vitórias, as tantas vitórias que tivemos à custa dele, e vamos sorrir.

Vou ter saudades de Hulk. Era um homem da casa, capitão de equipa sem que convencesse que era esse o seu principal papel, mas fundamental na forma como melhorou a relação com os árbitros a partir desse momento. Foi bruto, rijo, duro e genial; foi agredido, pontapeado, injustiçado e justiceiro; foi golo, remate, míssil, decisivo. Hulk foi nosso durante anos e a partir de hoje deixa de o ser. E temos todos de aprender a jogar sem ele, porque tal como Deco ou Quaresma, quando sai uma peça de tal maneira fundamental na estrutura de uma equipa, é natural que todos iremos sentir a sua falta. Cabe aos adeptos entender isso e exigir que os outros todos saibam calçar as botas do 12 e aproveitem para marcar o seu próprio nome.

Hulk houve um. Agora, temos de ter vários para suprir a falta. Boa sorte, rapaz.

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