O Álvaro-gate que não é gate nenhum

Acho sempre curiosas as reacções dos jogadores quando se apercebem que vão ser substituídos. Há atitudes para todos os gostos que merecem toda a escalpelização possível pela parte de treinadores, adeptos e jornalistas, cada qual com a sua agenda particular no que toca à forma como vêem a saída de campo do jogador. Álvaro protagonizou em Braga mais um destes episódios que levam ao epílogo de análises, insinuações, críticas ou louvores. O costume.

Álvaro saiu chateado. Insultou anjos e mafarricos, agrediu a cobertura do banco como um Mozer uruguaio e deixou-se na conversa com Rolando até ao fim do jogo. Estava lançada a insurreição na equipa, o armagedão interno que todos apregoam e rumores de um boicote uruguaio ecoaram nas mentes de tantos adeptos, nossos e deles, sequiosos por qualquer sabugo que se possa puxar para ensanguentar o Dragão. O costume.

E admito que estas cenas não são tão costumeiras quanto isso no quotidiano portista. Aquele hábito da tradicional frieza competitiva, da emoção só lá dentro e nunca cá para fora, a fleuma que todos esperam que transfigure as almas de qualquer jogador quando vê o seu nome naquela placa que o árbitro levanta e que acalme a mentalidade lutadora durante os breves segundos que se prolongam enquanto o rapaz se encaminha para fora do terreno de jogo, normalmente não se vê. Mas há algumas situações em que não é possível aguentar e esta foi uma delas. Como tantas no passado, como Jardel ou Jorge Costa, Rolando ou Sérgio Conceição, Belluschi ou Deco, já houve tantas vezes que jogadores contestaram a sua saída com as armas que tinham na altura e que habitualmente se traduzem no arremesso de diatribes ou garrafas de Powerade (PUB).

Para vos dizer a verdade: não me incomoda.

Incomoda-me muito mais ver um jogador a sair com a lentidão que vi Varela a fazer aqui há uns meses. Ou quando as substituições recebem assobios como a de Defour por Souza no Dragão há mais alguns meses. Isso é que me incomoda nalgumas substituições. Ou quando são feitas tarde demais como no jogo em casa contra o Manchester City. Isso sim, incomoda-me. E percebi que um jogador que estava a fazer uma partida horrível e já amarelado falhava posicionamentos defensivos consecutivos (e arriscando-se a ser expulso naquele que era talvez o jogo mais importante da época) não podia continuar em campo muito mais tempo. Eu percebi isso e adivinhei a substituição. Vitor Pereira percebeu mais cedo que eu, obviamente, teve a coragem de o tirar de campo e colocar alguém fresco que pudesse fechar o flanco. Álvaro não gostou. Nem eu gostaria. Porque se fosse eu, se estivesse há mais de uma hora a fazer um dos piores jogos da minha vida, a mostrar a qualidade técnica de um alce bêbado depois de três épocas a grande nível…e não tivesse oportunidade para me redimir em campo e dar o máximo que podia à equipa…também ficava lixado. E tenho a certeza que o assunto é facilmente sanado com uma conversa a frio, depois do jogo, quando todos estiverem calmos. Se eu fosse treinador do FC Porto esperava que o autocarro chegasse ao Porto e nem aí falava com o moço. Cumprimentava-o à saída e deixava-o ir para casa pensar na atitude que teve. E no dia seguinte, frescos e prontos para mais uma semana de trabalho, chamava-o ao gabinete e falava com o moço. Não tenho dúvida que o rapaz compreendia e provavelmente seria ele a tomar a iniciativa de se retractar.

Ponham-se no lugar dele. É simples.

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Baías e Baronis – SC Braga 0 vs 1 FC Porto

foto retirada de desporto.sapo.pt

São estes jogos, nas circunstâncias em que são disputados, com a relva nos dentes e os olhos raiados de vermelho-sangue, que fazem ou desfazem campeonatos. É com a força interior, com a capacidade de esforço e dedicação a uma causa conjunta, lutando contra uma equipa de grande valor que sente o mesmo que nós e luta pelo mesmo objectivo, que se consegue chegar ao ponto mais alto da classificação de uma temporada tão atípica e tão cheia de altos muito altos e baixos demasiadamente baixos. E foi esse FC Porto que vimos hoje na pedreira de Braga, um FC Porto que trabalhou em conjunto, que se uniu nos momentos difíceis e encarou este jogo como uma partida de importância vital para um final que se quer perfeito depois de uma época imperfeita. Foi enervante, difícil, cansativo. E foi nosso.

 

(+) Maicon e Otamendi Mais até que Hulk, os dois homens no centro da defesa do FC Porto foram quase perfeitos nas posições que ocupavam. Tanto o brasileiro como o argentino estiveram em grande na cobertura defensiva, no controlo do ataque do Braga que raramente conseguiu criar perigo para Helton porque não conseguiram passar pela parede que foi formada pela nossa dupla de centrais. Parece estranho ver Otamendi a brilhar a tão grande altura em Braga (no ano passado marcou lá dois golos) depois de o termos visto em tantos jogos a fazer tanta borrada, mas a verdade é que talvez tenha feito a melhor exibição da época. Maicon não complicou, mais uma vez, e apesar de alguns passes falhados no desenrolar de jogadas ofensivas, ajudou muito a equipa com a força e a imponência do jogo aéreo em zonas recuadas. Rolando, rapaz, parece que começas a ficar com os dias contados.

(+) Hulk O herói da noite. Só parou de correr quando não conseguiu mais e mesmo assim foi muito útil a tapar as subidas de Elderson e continua a ser o elemento mais profícuo no nosso ataque, por vários motivos. Porque é por ele que obrigatoriamente as jogadas de ataque têm de passar para que os desiquilíbrios o sejam de facto. Reparem nas duas jogadas que na primeira parte deram remates de Lucho para boas defesas de Quim. E o remate quase sem ângulo que daria o golo do ano e que fez com que Quim fizesse uma das melhores defesas que me lembro de ver na minha vida, de puro instinto e perfeita noção de espaço. Hulk, para além do golo, é importante acima de tudo quando joga a este nível, com força, garra e a complicar pouco. Se conseguirmos ser campeões este ano, o título é em grande parte dele.

(+) Defour Tinha as minhas dúvidas acerca da capacidade do meio-campo do FC Porto aguentar o do Braga sem Fernando no onze. Mas o belga esteve em todo o lado, com garra, esforçado, prático, sem inventar. Não tem e nunca terá a disponibilidade física de Fernando mas compensou essa natural inépcia com um excelente posicionamento, intercepções importantes e saídas rápidas para o contra-ataque com passes bem apontados e boa visão de jogo. Soube quando driblar, quando passar, quando correr e quando parar. Gostei.

 

(-) Álvaro Pereira Não dou um Baroni a Álvaro pela reacção à substituição. Falava com um amigo acerca disso enquanto via o jogo e ambos concordávamos que preferimos ver um jogador chateado por sair quando acha que pode e deve continuar em campo e discordar abertamente do treinador. Não me maça minimamente desde que as coisas sejam esclarecidas a posteriori, mais a frio. Mas Álvaro estava a fazer um jogo tão trapalhão, com inúmeras perdas de bola por mau domínio do esférico, cruzamentos para ninguém e mau posicionamento defensivo. Não fosse a ajuda de James e de Moutinho pelo seu lado e Alan teria sido bastante mais produtivo. Saiu bem.

(-) Kleber Compreendo a opção de Vitor Pereira. Um avançado mais móvel, mais mexido, menos posicional e que pudesse recuar para vir buscar jogo, tudo faria sentido…se Kleber conseguisse estar em jogo mais vezes. Mas foi quase impossível porque o brasileiro não parece assentar bem na equipa, produz muito pouco e perdeu até a loucura dos primeiros jogos em que corria mais do que tocava na bola, parecendo desistir com enervante facilidade dos lances. Custa-me olhar para este rapaz e pensar que era a aposta para titular no FC Porto 2011/2012.

(-) A continuação da saga “Porque é que falhamos tantos passes?” É a mesma história semana sim, semana sim. A quantidade de passes falhados e lances que consequentemente se perdem na sequência dessa inépcia técnica é assustadoramente elevada para uma equipa do nosso nível. Não consigo compreender o porquê de tanto falhanço, de não se conseguir ligar o jogo entre sectores de uma forma consistente, porque gostaria de pensar que as nossas sessões de treino incluem algo mais que umas corridas e meia-dúzia de peladinhas. Palavra de honra que os punha a acertar num poste a distâncias variáveis e quem falhasse tinha de limpar o telhado do Dragão preso só por um fio dental. Era só para ver se os gajos começavam a acertar os passes em condições.

 

Cinco pontos à frente do Braga e doze pontos em disputa. Não os afastámos de vez do campeonato, mas demos uma facada nos gémeos da qual não será fácil aos bracarenses recuperar. Já o Benfica…é outra história. Se os rapazes de vermelho decidirem ir vencer a Alvalade, podemos ter campeonato até ao fim. Raios, mesmo que não consigam ganhar na retrete do Lumiar, também vamos ter época até à 30ª jornada, quando muito até à 29ª. De uma coisa não podemos fugir: o FC Porto está na posição mais que primária para poder garantir o bicampeonato. E hoje, depois do jogo, enquanto me acalmava depois da quarta ou quinta cerveja, fiquei a pensar que este podia ter sido o jogo do título. Bastava termos feito mais três ou quatro jogos com esta intensidade. Merda, custa-me tanto reviver Barcelos, Olhão ou Aveiro…só espero que esse tempo tenha ficado para trás.

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Ouve lá ó Mister – Braga


Amigo Vítor,

Olha ali para o fundo. Estás a ver o mesmo que eu? É uma linha, não é? Já está à vista, não está? É o final do campeonato, homem. A partir daqui já não podemos olhar para trás, para todos os pontos que perdemos contra equipas que não deviam ter tido a capacidade de os roubar do nosso saco, já não temos o luxo de ver videos de jogos de um passado mais recente do que queríamos, disputados em Olhão ou Aveiro ou Barcelos (para não dizer Coimbra, Lisboa, São Petersburgo ou Nicosia porque essas são contas de outros campeonatos) porque o tempo agora é de olhar para a frente. Já o era há meses, mas agora é mesmo mesmo mesmo mas MESMO preciso olhar em diante para enfrentar o horizonte que se aproxima tão rapidamente. Hoje, o horizonte arrasta-se mais um naco na nossa direcção.

Tens duas ou três hipóteses de encarar este jogo. A primeira é vê-lo como fizemos no ano passado na final da Liga Europa. Frios, feios, porcos e maus. Sem brilhantismos, com eficácia, olhar na baliza e ganhar por meio já é um bom resultado. A segunda opção é fazer um jogo de construção ofensiva entusiasmante, perfeição posicional defensiva e troca de bola a meio-campo que faz o Michels pensar que a Laranja Mecânica ressuscitou e joga de azul e branco. A terceira…é ser sério e perceber que apesar do Braga mostrar qualidade e apesar de ter um grupo de rapazes entusiasmados e interessados no jogo…nós somos melhores. Mas temos de mostrar que somos melhores no campo, com inteligência, passando bem a bola, aliviando quando houver perigo na defesa e rematando quando houver uma brecha para o fazer na frente. Lucho e Moutinho vão ser fundamentais. Hulk também. James também. Raios, todos são essenciais, até os do banco. Temos de jogar bem, temos de ser unidos, temos de estar concentrados.

O jogo vai ser difícil. Todos temos essa noção. Mas também temos a noção que vocês sabem disso. E não há mais nada que passe pelo coração de qualquer portista que não a vitória hoje à noite na Pedreira. O Braga tem feito uma excelente temporada, é verdade. E se depender de mim, essa excelente temporada acaba hoje.

Sou quem sabes,
Jorge

 

APOSTAS PARA HOJE NA DHOZE:

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Sejamos os nossos próprios estofadores

Odeio clichés. Estou a usar a palavra “odeio” para me referir a clichés, para verem a força da minha aversão ao uso desses recursos. Nunca estou “à beira de um ataque de nervos”, “perto do precipício” ou “com fogo no rabo”, não dou “uma no cravo outra na ferradura”, não sou “amigo da onça”, não choro “lágrimas de crocodilo” nem “faço das tripas coração”. Evito-os como um acrófobo foge dos telhados de arranha-céus.

É em grande parte devido a esse escárnio pela muleta fácil de qualquer língua que me incomoda a grande maioria das notícias dos nossos jornais. A sequência de lugares-comuns é tão escabrosa e entediante que deixa qualquer um com o nível de tédio tão alto que apetece ler um bocado de Kafka só para desempoeirar o cérebro. Salvam-se alguns cronistas que por muito antagónicas que sejam as posições defendidas perante os mais diversos assuntos do panorama da bola quando comparadas com as minhas, há alturas em que cedo à qualidade da retórica e penso para os meus bot…(não, Jorge, clichés não, és superior a isso)…e penso: “Ah, seu malvado. Confundes-me com esta retorcida verborreia e colocas-me perante a periclitante posição de ter de ceder às tuas vontades. Não deixarei que a tua vil eloquência me conquiste, pulha!”. Depois passa-me a fúria e mudo de página.

Tanta parvoíce para dizer o seguinte. Estou farto do termo “estofo de campeão”. A primeira vez que ouvi essa alarvidade fiquei a pensar que estavam a falar de um sofá muito caro, mas aparentemente é aplicada no mundo do futebol, quando uma equipa consegue chegar a uma determinada altura da época num lugar perto do topo e com possibilidades de chegar ao final em primeiro lugar. E o Braga, admito, é uma equipa que tem…aham…estofo de campeão. E nós? Toda a gente nos diz desde o início da temporada que não o temos. Que o perdemos, que o deixamos no Metro, sei lá, mas de qualquer forma a imagem que tem sido constantemente passada por jornalistas e analistas (raios, até pelos próprios adeptos!) é a de que o FC Porto é uma equipa sem técnica, sem liderança e à rasca para se manter viva e na luta pelo título, ao passo que o Braga está pujante e vibrante, com a força de duzentos sóis e a energia de duzentos mais.

Não suporto isto. Estamos em primeiro no campeonato e dependemos só de nós para sermos campeões. As exibições não têm sido geniais? Too fucking bad. Só lá estamos porque os outros têm perdido pontos inesperados? Também nós. O Braga joga melhor futebol que o FC Porto nesta altura? Veremos.

Só há uma coisa a pensar até Sábado: quem vencer o jogo mostra que tem estofo de campeão. Mas sejamos nós ou eles a sair do Axa com os três pontos, a outra equipa não é automaticamente “desestofada” porque até ao fim ainda há mais quatro jogos. O único pensamento até Sábado, repito, tem de ser este: vamos ganhar este. E depois vamos ganhar os próximos.

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