
A principal função de um jogador de futebol é mesmo essa. Jogar. Seja em que posição for, desempenhando que papel lhe esteja atribuído pelo desígnio dos deuses que lhe deu o talento necessário (por vezes suficiente) para poder jogar numa equipa como o FC Porto. E Helton foi, ao longo de onze anos, um jogador. Mas foi bem mais que isso.
Helton foi capitão de equipa durante vários anos. Foi uma das imagens de marca da era Jesualdo e Villas-Boas, esteve em grandes momentos, venceu tudo o que o clube venceu durante todo o tempo em que defendeu as nossas redes e o papel que lhe coube na hierarquia foi subindo, desde a ameaça ao posto divino de Vitor Baía até à cedência do lugar perante um homem tão ou mais capaz na função mas com uma bagagem de títulos e nome que tornaram redundante a sua presença no plantel. O homem foi crescendo e o clube lucrou com a sua presença tanto como ele, talvez mais. Helton sempre pareceu um homem diferente, um capitão tão díspar dos seus antecessores que raramente conseguíamos perceber o quão importante era para os colegas e para todos os adeptos. Era o gajo do violão, o maluquinho que tocava bateria numa banda e que fazia (oh, meu Deus, os tempos mudaram tanto!) concertos ao vivo. Uma espécie de Osvaldo com menos gajas mas um carisma tremendo.
E custa-me, como custará a tantos outros portistas, ver Helton a sair do clube. Compreendo a decisão mas custa-me na mesma. Não sei o que irá fazer, se optará por um curto final de carreira ao serviço de um clube brasileiro, se a enriquecer em dinheiro e experiência pessoal através de uma viagem para o Oriente. Ou se, pendurando as luvas, vai entrar pela porta do balneário para se equipar com a mesma camisola de treino, deixando-a de lado em dia de jogo em prol de um rapaz mais jovem que receberá os seus ensinamentos.
Mas Helton merece mais. Helton merecia mais. Nós merecemos mais. Falta-nos a cultura britânica dos “testimonials”, das homenagens em fim de carreira, onde se arranja um Helton XI para jogar contra o actual FC Porto num registo de amizade e boa camaradagem como prova do carinho e da alma das pessoas. Raios, desenrasquem aí uma equipa de onze guarda-redes e ponham o homem a ponta de lança, afinal era (e é, com mil Sonkayas!) bem jeitoso a jogar com os pés e a malta ainda se ria um bocado que bem precisamos. Aquilo que fizemos com Deco devíamos fazer com todos os ícones que saem do clube ao final de tanto tempo, o mesmo que deveríamos ter feito com João Pinto ou André ou tantos outros que seguiram o mesmo percurso. Não é pelo dinheiro, é pela história. Pelo nome e por fazer com que perdure.
Não há comunicados ou tweets que paguem isso. A alma não se pode perder e é nestas pequenas coisas que se vê uma comunidade viva e um clube vibrante e unido. Estamos muito longe disso. É pena.
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